Em primeiro lugar, devemos reconhecer que Rick e Morty nunca foi apenas um desenho animado sobre viagens interdimensionais e humor ácido. A série frequentemente mergulha em questões filosóficas e psicológicas, apresentando narrativas que, por trás do absurdo, carregam reflexões profundas sobre a mente humana. O episódio 10 “Fear No Mort”, da sétima temporada, é um excelente exemplo disso, explorando os medos reprimidos de seus protagonistas de uma maneira que faria Sigmund Freud se sentir em casa.
Nesse episódio, Rick e Morty são convidados a entrar em um buraco onde serão submetidos aos seus medos mais intímos e profundos. No enredo do episódio o buraco se alimenta do medo, e você só consegue sair do Buraco quando enfrentar seus medos e supera-los. E isso nos dá uma brecha para explorarmos o conceito Freudiano de Inconsciente e medo. Vamos lá entrar nesse buraco para descobrir mais sobre tudo isso?
O Buraco do Medo e o Inconsciente Freudiano
No episódio, Rick e Morty caem em um buraco misterioso que manifesta seus maiores temores. A experiência não é apenas um desafio físico, mas um verdadeiro mergulho na psique de cada um deles, principalmente na de Morty. Conforme Freud argumentava, muitos dos nossos medos são reprimidos no inconsciente, mas acabam emergindo em momentos de crise. Aqui, o buraco funciona como uma espécie de portal para essa camada oculta da mente, onde os Morty é forçado a enfrentar seus traumas.
Freud acreditava que os impulsos e memórias reprimidos poderiam surgir na forma de sonhos ou sintomas neuróticos. No episódio 10 da 7ª Temporada, o que vemos é a materialização direta desses medos, colocando Rick e Morty frente a frente com aquilo que evitam a todo custo. O maior medo de Rick, por exemplo, parece ser a culpa e a perda de Diane, sua falecida esposa. Quando ele a vê na sala de estar após escaparem do buraco, a dúvida persiste: será que eles realmente saíram ou ainda estão presos em suas próprias mentes?
O Medo como Mecanismo de Defesa
Assim como Freud propunha que o inconsciente usa mecanismos de defesa para evitar o sofrimento, Rick também recorre a uma série de estratégias para lidar com seu medo. O cinismo, o alcoolismo e a fuga para aventuras absurdas funcionam como barreiras contra a introspecção. No entanto, este episódio quebra essas barreiras, obrigando-o a encarar de frente suas emoções.
Morty, por outro lado, representa a ansiedade de quem ainda não desenvolveu formas tão complexas de defesa. Seu medo se manifesta de maneira mais crua e direta, revelando sua insegurança e vulnerabilidade, típico de um jovem adolescente. Ele não tem as mesmas ferramentas de Rick para reprimir seus traumas, o que o torna uma espécie de espelho para o espectador, que pode se identificar mais facilmente com suas reações.
O Eterno Retorno do Medo
O episódio também brinca com a ideia nietzschiana do Eterno Retorno, sugerindo que os medos podem ser cíclicos. A aparição de Diane, a falecida esposa de Rick, no final sugere que Rick nunca escapou verdadeiramente do buraco — e talvez nunca escape. Assim como a Lei de conservação de energia, na qual diz que basicamente que a energia não some, só muda de forma — o medo, quando não enfrentado, tende a retornar em diferentes formas, um conceito que ecoa o pensamento psicanalítico de que aquilo que reprimimos sempre encontra um jeito de voltar à superfície.
Isso levanta uma questão interessante: podemos realmente superar nossos medos, ou apenas aprendemos a conviver com eles? Rick e Morty não nos dá uma resposta definitiva, mas sugere que ignorá-los não é a melhor opção.
Humor e Filosofia em Rick e Morty
Assim como a série sempre faz, “Fear No Mort” equilibra momentos de humor com reflexões profundas. O absurdo da situação — um buraco que materializa os piores medos — é uma metáfora brilhante para a experiência humana. Quem nunca se viu preso em seus próprios medos, incapaz de discernir se já superou uma questão ou se apenas se acostumou a viver com ela?
Em um momento particularmente divertido, Morty enfrenta um medo que parece banal, mas é extremamente real para muitas pessoas: a rejeição. Enquanto isso, Rick tenta racionalizar suas emoções, como se pudesse escapar da dor apenas com lógica e sarcasmo, como um mecanismo de defesa. Contudo, como Freud sugeriria, o inconsciente não pode ser derrotado pela razão pura. No final das contas, o episódio nos lembra que o verdadeiro terror não vem de monstros interdimensionais, mas sim das verdades que evitamos encarar.
Conclusão
Dessa forma, Rick e Morty mais uma vez entrega um episódio que vai além do entretenimento e nos convida a refletir sobre nossa própria psique. O buraco do medo pode ser interpretado como um espaço simbólico onde somos confrontados com nossas inseguranças mais profundas.
Seja na ficção ou na vida real, ignorar os medos não os faz desaparecer, pelo contrário. Como Freud apontou, eles apenas encontram novas formas de se manifestar. Portanto, talvez a lição desse episódio seja que enfrentar nossos medos é a única maneira real de seguir em frente — mesmo que isso signifique encarar algumas versões imaginárias de nossos traumas pelo caminho.
Gostou de refletir sobre como o medo trabalha em nossa mente? Veja também o nosso artigo anterior: ‘O Tempo Existe? Santo Agostinho e o Mistério da Temporalidade‘. Nele, exploramos as profundas reflexões de Santo Agostinho sobre o tempo e como ele molda nossa percepção da realidade. Clique aqui para ler e mergulhe nessa fascinante discussão filosófica!